Segundo o crítico Shūichi Katō (1919 – 2008) em seu livro Tempo e espaço na cultura japonesa (Estação Liberdade, 2011), existem diferentes tipos de tempo dependendo da cultura, organização da sociedade e até mesmo religião. Segundo o autor, “(…) na cultura japonesa, coexistiam três modos de tempo diferentes. Ou seja, uma linha reta sem começo e sem fim = tempo histórico; o movimento cíclico sem começo e sem fim = tempo cotidiano; e o tempo universal da vida, que tem começo e fim. E todos os três tempos se voltam para a ênfase do viver no ‘agora’” (p. 53).
Juntamente com essa reflexão sobre o tempo, apresento imagens produzidas pelo artista japonês do movimento Shin-Hanga Hiroshi Yoshida (1876 – 1950), que viveu em uma época em que o Japão se abre para o mundo oficialmente, depois de manter seus portos parcialmente fechados, sobretudo para o Ocidente.
Desde muito jovem Yoshida teve a oportunidade de viajar e conhecer novas culturas, além de expor seus trabalhos em diferentes lugares. Ele foi bem recebido no exterior e suas obras foram apreciadas pelo público, conseguindo comercializar a maioria de suas pinturas após suas primeiras exibições nos Estados Unidos. Apesar de o artista ter tido uma carreira como pintor, atualmente é mais reconhecido por suas xilogravuras (mokuhanga).
Em um momento em que o seu país vive esse processo de ocidentalização, Yoshida se vê entre múltiplas transformações, entre múltiplos tempos. Diante disso, ele cria séries de xilogravuras que falam sobre a passagem do tempo. Mas não só isso: com elas, Yoshida também faz um estudo da luz que incide de diferentes formas e intensidades nas paisagens.
Em cada uma dessas imagens feitas em xilogravura, podemos ver que Yoshida selecionou alguns blocos de madeira para transmitir o que ele queria, ou seja, não utilizou as mesmas matrizes em toda a série e também escolheu diferentes cores e tons em suas representações. Contudo, aqui queremos destacar o fato de cada uma expressar um sentimento diferente, ainda que façam parte de uma série, de um todo. O que você sente ao ver as imagens?
Diante de todo o caos vivido em 2020, diante de um tempo que passa cada vez mais rápido, me pergunto sobre qual tempo Yoshida estava falando nessa série. Talvez sobre o tempo cotidiano, “o movimento cíclico sem começo e sem fim”. Se por um lado aqui estamos discorrendo sobre o tempo nas gravuras de Yoshida, por outro, essas imagens captam e congelam um momento, como um tempo pausado.
Segundo Kato, “os músicos japoneses costumam considerar a ‘pausa’ importante. Como bem se sabe, a ‘pausa’ é o intervalo entre dois sons, a distância temporal é o comprimento da duração do silêncio.” Ainda que estejamos falando sobre o tempo, o convite hoje é de pausa, respiro, para então ter um momento de contemplação.